terça-feira, 16 de fevereiro de 2010

AS RELAÇÕES INTERNACIONAIS EM XEQUE: UMA NECESSIDADE DE ANÁLISE CRÍTICA

A economia política internacional em síntese

As teorias que envolvem as relações internacionais têm avançado muito desde o divisor de águas marcado pelo término da segunda guerra mundial. Mesmo as teorias mais conservadoras como o Realismo e o Liberalismo com suas variantes tem se adaptado as mudanças no contexto da guerra fria, assim como as outras teorias concorrentes como a teoria crítica e a teoria marxista.

Apesar da guerra fria ampliar seu debate político-ideológico após o conflito armado da segunda guerra mundial, esse contexto começa a se moldar a partir da efervescência da primeira guerra mundial e principalmente da Revolução Russa de 1917. O conflito bélico entre as nações e a guerra civil russa possibilitou a ascensão de uma nova ordem mundial antagônica ocidental e oriental.

Segundo Noam Chomsky a guerra fria inicia sua trajetória de disputa entre os valores, culturas, política, economia e sociedade entre o ocidente capitalista e a órbita do leste europeu capitaneada pela ex União Soviética a partir de 1917-24 (período que se instala o Estado socialista).

As relações internacionais baseadas nos estudos do idealismo avançam para as análises críticas do realismo e o liberalismo a partir desse período de disputas entre as nações e rupturas econômicas cruciais, como a crise de 1929. O vazio de lideranças entre o primeiro e o segundo conflito bélico mundial no plano político e econômico precipitou a segunda grande guerra e exacerbou o antagonismo entre as civilizações ocidental e oriental.

O morticínio das minorias étnicas, as perdas humanas da guerra, o choque das bombas atômicas e a destruição da Europa fez surgir uma necessidade de reconstrução da estrutura física e da organização do sistema econômico e político nos moldes da democracia liberal burguesa capitaneada pelos Estados Unidos e pela economia planificada capitaneada pela então União Soviética que agudizava a disputa em um paradigma mais elevado da guerra fria.

A construção do Welfare State (Estado de Bem Estar Social) principalmente na Europa e o modelo de socialismo planificado pelo Estado nos países pertencentes a órbita soviética ascenderam as disputas pela liderança de valores e de civilização em nível mundial. Essas disputas fazem com que, as teorias crítica e marxista das relações internacionais ampliem seu terreno no debate intelectual do século XX.

O acordo de Bretton Woods que definiu o padrão monetário internacional comandado pelo lastro ouro-dólar e as políticas pactuais entre trabalhadores e empresas a partir de meados do século XX revigoraram o sistema capitalista de base taylorista-fordista e permitiram o avanço da chamada “Era de Ouro” do capitalismo. Do outro lado, o socialismo real apresentava forte crescimento econômico e investimentos em setores de tecnologia bélica e espacial.

O sistema econômico internacional capitalista e a economia soviética planificada concentram as disputas enquanto no plano político as guerras das Coréias do Norte e do Sul, do Vietnã, os golpes militares e as lutas pela independência cruzam as fronteiras da África e da Ásia sempre orbitando entre os eixos de influência soviéticos e estadunidenses.

As disputas entre árabes e judeus no Oriente Médio e a ascensão da China como uma nação de peso no sistema geopolítico internacional ultrapassam as fronteiras da instabilidade econômica dos anos de 1970 com o rompimento de Bretton Woods, as crises do petróleo arquitetadas pelo cartel da OPEP (Organização dos Países Exportadores de Petróleo) e a crise da dívida pública dos países latino-americanos completam o quadro de transição de uma nova ordem mundial sobre os auspícios de um novo paradigma em formação, baseado em um tripé, em que pesa o comando da globalização, do neoliberalismo e da revolução tecnológica capitaneada pela microeletrônica.

As zonas de influência política e econômica a partir dos anos de 1980 começam a incorporar novos atores quanto a partilha do poder. Os Estados Unidos reinaram durante a chamada “Era de Ouro” do capitalismo (expressão cunhada pelo historiador egípcio-britânico Eric Hobsbawn), quer dizer, durante praticamente um quarto de século, entre 1945-70, onde os estadunidenses detinham mais da metade do PIB mundial; mas a partir do desmantelamento do sistema monetário internacional do lastro ouro-dólar países como a Alemanha e Japão juntam-se a superpotência para formar a tríade; expressão que significa que a partir de então existem três grandes economias mundiais: Estados Unidos, Japão e Alemanha com suas respectivas moedas fortes e graus de influência.

A crise da dívida pública combinada com altíssimos índices inflacionários explode nos anos de 1980 nos países latino-americanos concomitantemente ao ressurgimento da guerra fria como espetáculo a partir do governo Reagan, assim como sucessivos golpes de Estado comandados pelo Pentágono contra os governos democraticamente eleitos da América Central. Os anos de chumbo de 1960 e 1970 pertenciam aos países da América do Sul, principalmente Brasil, Argentina, Uruguai, Paraguai e Chile e a partir de 1980 o foco se move na direção dos países da América Central como Guatemala, Nicarágua e El Salvador.

A guerra nas estrelas patrocinada por Reagan, principalmente no seu primeiro mandato (1980-84) perde fôlego no segundo, já que Mikail Gorbachev inicia um período de abertura denominada de Perestroika. A aproximação entre as duas superpotências conduz a um movimento de rompimento com o antigo regime socialista. Antigo, devido ao enfraquecimento previsível da superpotência político-militar e da sua legitimidade em termos sociais, culturais e econômicos.

O esfacelamento do regime político; sua identidade e legitimidade são pulverizados com a simbólica queda do muro de Berlim no início de novembro de 1989 e colocados à prova quando as demais nações do leste europeu rompem gradativamente com o poder central de Moscou. Mesmo a União Soviética, sucumbe à pressão e desmonta seu estado socialista em 1991; ano em que a guerra do Iraque deixou mortos e um recado a um antigo adversário: a partir desse momento a civilização ocidental, capitaneada pelos Estados Unidos reagrupa suas forças em torno da órbita do G7 (grupo dos sete países mais ricos do mundo) somado agora com a Rússia – G8 e proclama a economia de mercado e a democracia liberal burguesa como as formas mais avançadas e adequadas de compartilhar os valores econômicos, políticos, culturais e sociais de um sistema de sociedade.

Esse então, pode ser considerado o momento de um novo divisor de águas; e segundo a visão pragmática e conservadora como o “Fim da História” (expressão cunhada pelo cientista político estadunidense Francis Fukuyama) revelado em uma imagem de visível derrocada do sistema soviético após a queda do regime. A terceira revolução tecnológica da Era da Informação e a imposição do consenso de Washington a partir do capitalismo sem fronteiras do novo liberal (lassez fare - lassez passe) colocaram os Estados Unidos em uma posição privilegiada no estratagema geopolítico mundial; mas essa nova ordem mundial em ascensão não havia ainda revelado as facetas subjacentes do sistema econômico e político mundial.

A derrocada do socialismo real europeu fez acender o alerta chinês. Desse alerta surge a necessidade da China de mergulhar em uma economia capitalista dirigida pelo Estado, mas não aos moldes soviéticos. A economia de mercado aliada a um sistema repressor centralizado pelo partido comunista colocou a China na rota dos países emergentes juntamente com o Brasil, Índia e Rússia logo depois do 11 de setembro estadunidense. Esses emergentes não estão no mesmo patamar, já que a relativa estabilidade brasileira, tomado como exemplo, está alicerçado sob uma economia política de raiz continuísta, apesar do avanço de algumas políticas sociais

A economia estadunidense se mantém através de um keynesianismo baseado na estratégia do sistema do Pentágono e da NASA com muito gasto público nas áreas de pesquisa e desenvolvimento de tecnologias de ponta e aquece o consumo interno através de gigantescos endividamentos público e privados, em grande parte graças a China que adquire títulos dos Estados Unidos, além de exportar produtos em grande quantidade para esse país.

A nova ordem mundial capitaneada novamente pelos Estados Unidos inicia seu ciclo de expansão a partir dos anos de 1990 (em particular os anos Clynton) e abre o século XXI de Bush filho deflagrando uma guerra contra o “terror” (expressão proposital para designar grupos de terrorismo. Leia-se: e países considerados inimigos ou ameaças a ordem geopolítica mundial), em um mundo que a bolha especulativa estourou, os atores adjacentes se fortaleceram e os Estados Unidos não teve como impedir a formação de um mundo cada vez mais compartilhado em termos de interesses e ao mesmo tempo disputas em uma nova e ao mesmo tempo velha ordem mundial.


Autor: Marcelo Gonçalves Marcelino

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