quarta-feira, 3 de março de 2010

A economia açucareira do agronegócio e as parcerias institucionais

Folha de São Paulo - Caderno Dinheiro

São Paulo, quarta-feira, 03 de março de 2010

Governo quer Petrobras para barrar estrangeiros no etanol

Preocupado com "invasão" do setor, Planalto articula fortalecimento da ETH-Brenco



Petrolífera poderá ter até 40% da sociedade com a empresa, controlada pela Odebrecht, repetindo parceria também feita na área petroquímica


LEILA COIMBRA

DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

O governo está preocupado com a "invasão estrangeira" na cadeia de produção de etanol. Para evitar o processo de desnacionalização, o Planalto articula o fortalecimento da recém-criada ETH-Brenco, da qual a Odebrecht é a controladora, via Petrobras e BNDES.

Segundo a Folha apurou, a estatal petrolífera negocia fatia de até 40% na sociedade (cerca de R$ 2,8 bilhões, considerando o valor estimado da nova companhia, de R$ 7 bilhões). O BNDESPar (braço de investimento do banco estatal), por sua vez, investirá R$ 300 milhões em aumento de capital para manter participação de 16,6% na empresa (fruto de dívida convertida em ações).

Além disso, a Petrobras tem planos de adquirir em 2010 outras três usinas de cana, investindo R$ 450 milhões na operação, que se somariam ao patrimônio da ETH.

A preocupação do Planalto com o processo de desnacionalização da cadeia do etanol atingiu seu auge no mês passado, quando foi assinado o memorando de entendimento entre a norte-americana Shell e a brasileira Cosan para a criação da líder mundial do setor, avaliada em US$ 12 bilhões.

A transação marca a entrada de uma petrolífera na área. E a Petrobras, apesar de ter criado subsidiária para atuar em biocombustíveis e de ter comprado uma usina de cana em dezembro passado por R$ 150 milhões, não produz um litro sequer de etanol no país.

Antes disso, a americana Bunge havia comprado o grupo Moema e as francesas Louis Dreyfus e Tereos adquiriram a Santa Elisa e a Açúcar Guarani, respectivamente, além de outras operações nas quais sempre o capital estrangeiro comprou participação nacional.

Segundo analistas ouvidos pela Folha, a entrada da Petrobras na ETH seria oportuna para a Odebrecht reduzir a dívida da companhia. A nova empresa possui ativos de R$ 3,8 bilhões, fruto do investimento feito pelas duas empresas nos últimos anos. Deste total, 60% veio por meio de empréstimos, inclusive R$ 1,8 bilhão liberado no final de 2008 pelo BNDES.

Não será o primeiro negócio em que a Odebrecht é fortalecida com a atuação estatal em um setor, via Petrobras. No início do ano foi a vez da petroquímica. A Petrobras e a Braskem (controlada pela construtora) compraram a Quattor e formaram uma gigante da área. Com o etanol, as empresas poderão repetir o casamento.

A Petrobras informou que não negocia nenhum tipo de parceria com a empresa e não comentará negociações. Mas informou que seu plano de investimentos em combustíveis renováveis contempla US$ 4,5 bilhões até 2013.

Para o especialista em energia Adriano Pires, o setor está passando por grandes mudanças e por um processo de consolidação. No Brasil, até há pouco tempo as empresas do setor possuíam perfil familiar, e as usinas eram muitas vezes sediadas nas próprias fazendas. Hoje elas precisam se adequar às novas exigências do mercado de capitais para atrair investimentos. Segundo Pires, cerca de 50 usinas de cana podem estar à venda no país atualmente.

"O governo dormiu no ponto, focou no pré-sal e se esqueceu dos biocombustíveis, anteriormente a principal bandeira de Lula. Enquanto isso, os grandes grupos multinacionais deram os primeiros passos."


Planalto muda foco para criação de grupo forte


DA SUCURSAL DE BRASÍLIA


Nos últimos anos, o governo concentrou seus esforços na área de biocombustíveis no controle dos preços do produto no mercado interno e também nas negociações de comércio internacional para derrubar barreiras, criar mercado consumidor global e firmar o etanol brasileiro como uma commodity mundial.

Mas se esqueceu de criar um grande grupo nacional forte para atuar no segmento e ser referência internacional, em contraste com o que fez em setores como telecomunicações, alimentos, carnes, papel e celulose, petroquímica e energia.

Para especialistas do segmento sucroalcooleiro, a criação de uma grande empresa nacional para atuar na cadeia da cana-de-açúcar é essencial para desenvolver o potencial do álcool e para torná-lo uma commodity mundial, como deseja o governo.

Mas até então o principal esforço do Planalto nesse sentido era na tentativa de formação de estoques reguladores para evitar a alta volatilidade do preço do álcool combustível.

Nos últimos meses houve redução da oferta do produto devido às chuvas que prejudicaram a colheita e a qualidade da cana no final de 2009, provocando uma oscilação acentuada de preços.

Por conta disso, o governo anunciou recentemente que deverá formar, neste ano, um grande estoque regulador.

Para financiar a formação desse estoque, o BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) vai destinar R$ 2,5 bilhões.

Em 2009, os recursos para estocagem já haviam sido ofertados pelo BNDES, mas não houve sobra de etanol.

Na época, o montante era suficiente para financiar o armazenamento de 5 bilhões de litros de combustível, o equivalente a mais de três meses de consumo.

A partir de abril ou maio, quando estiver no período de safra, o mercado deve se regularizar, sobrando etanol, mesmo que a demanda de açúcar continue forte e que haja a possibilidade de estocagem.

E as mesmas chuvas que no final do ano passado prejudicaram as lavouras de cana-de-açúcar do país tendem a contribuir para uma produção recorde neste ano. (LC)














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