sexta-feira, 23 de julho de 2010

A farsa do debate eleitoral e a ausência de perspectivas

O debate político está enterrado e tornou-se eleitoreiro na democracia liberal burguesa no mundo e atualmente no Brasil. Isto pode ser comprovado através do comportamento dos candidatos que estão à frente das pesquisas eleitorais para a presidência da república. Em parte, a estratégia defensiva de como os temas são tratados me parece racional (que não significa o melhor dos mundos em termos de projeto autêntico, mas segue as linhas mestras de enxergar a política como ela é - lição de Maquiavel),  já que falar sobre assuntos como o aborto, os sem-terra e o controle ou a responsabilização dos meios de comunicação sobre as questões que envolvem a sociedade tornou-se chavão em termos de argumentos e ao mesmo tempo quase que impossível de ser tratado com a profunidade que merecem. Isso mostra que a igreja, o latifúndio  e a mídia são poderosíssimos em nossa Mátria (a mãe que acolhe todos com a distinção devida).
O candidato Serra faz isso com maior desenvoltura no sentido da facilidade com que se posiciona a favor das elites e a candidata Dilma trata desses temas sempre de forma muito treinada pela assessoria petista e outros atrás dos bastidores. O candidato tucademo comprova que seu partido nunca teve qualquer envolvimento com movimentos sociais no Brasil, apesar de sua sigla sugerir Partido da Social Democracia Brasileira - PSDB. Isso não aconteceria nem nos Estados Unidos, já que para um partido ser considerado social-democrata é no mínimo necesário que ele tenha afinidade ou ligação com bases sindicais de trabalhadores e outras agremiações ligadas as lutas sociais e democráticas.
A imprensa diz repetidamente que os programas dos dois partidos são muito parecidos para propositalmente confundir os eleitores, isto é, PT e PSDB, mas as ações negam tal propriedade, pelo menos quanto ao tratamento dado a determinados temas, principalmente a partir da política externa de Lula e outras negociações importantes com os próprios sem-terra e sindicatos, além de políticas públicas de inclusão e o tratamento dado ao funcionalismo público federal.
Enquanto isso o projeto de Serra é avesso a grande parte das questões voltadas a um melhor tratamento dado aos sem-terra e a universalização de políticas públicas de inclusão alternativas e outros projetos relacionados ao controle estratégico do Estado. Então, na prática os projetos são bem diferentes. Ao mesmo tempo, o pragmatismo de determinadas políticas econômicas, que é nada menos que a principal das políticas é tratada com o consenso esperado pela mídia e pelos banqueiros a partir dos dois candidatos principais à presidência. Nada fora do script para não causar nenhum tumulto na entidade chamada "mercado" antes das eleições como forma de barganha maior à sabatina eleitoral. Como bem lembrado pelo meu amigo Walter, as discussões tanto nos Estados Unidos quanto na Europa se referem a estabilidade econômica, mesmo que essas sejam remendos superficiais e que gerem crises cíclicas, corroborando com os próprios alicerces inerentes de um sistema na sua raiz desigual, isto é, o capitalismo.
A discussão está colocada, mas para infelizmente poucos, mesmo no universo da elite acadêmica e midiática, e que ainda tem a pretensão de enaltecer a expressão "voto consciente" como sendo aquela que irá nos salvar de todos ou quase todos os males da institucionalização da política parlamentar. Quanto a esse aspecto apoio o "voto raciona" da pobreza, que pelo menos enxerga o voto como a expressão de uma escolha baseada naquilo que vê e sente, isto é, políticas públicas concretas, ao contrário da nossa pequena burguesia ou classe média que escolhe aquilo que é incompatível com aquilo que tem e poderá ter, sem contar a ausência de uma perspectiva em termos de construção alternativa de nação, já que está mais preocupada com o seu consumo fetichizado por natureza de classe.

Sem muita hipocrisia me direciono no momento para o pragmatismo Lula-Dilma, já que o projeto político-partidário continua em aberto com algumas nuances dos partidos menores que se encontram à margem esquerda na sua essência, mas ainda por muito a fazer em termos de construção de uma alternativa que coloque o debate essencialmente político na pauta e que procuram, pelo menos, dar início a um movimento que venha a romper com o processo de desideologização que o sistema político burguês delegativo promove aliado a burocracia de Estado e ao capitalismo. Não se trata de um projeto elitista de argonautas e aos critérios delegativos de um Hércules político, ao contrário, ele deve ser construído socialmente. A questão está em como fazer isso, já que precisamos de indivíduos capazes e que ao mesmo tempo compreendam a real tarefa de inclusão política, sem iludir-se que a formação de um "voto consciente" iluminado e o discernimento e a participação política da sociedade ocorram por vontade própria e pela educacação nas escolas. Isso não irá acontecer, ao mesmo tempo que esperar que o coletivismo político venha a surgir de pessoas sem o mínimo preparo educacional, não aquele da escola evidentemente.  A luta política é extremamente desigual, por isso ela deverá formar as crianças e jovens a partir de uma educação que seja adequada aos moldes do conhecimento associado a luta política libertária. Ex: os sem-terra. Mas a questão continua em aberto: como construir uma educação alternativa em um mundo cada vez mais burocrático-institucional, onde o capitalismo preencheu quase todas as lacunas e opções de acesso as coisas que envolvem o mundo moderno. A cultura, o entretenimento, o lazer, o esporte e as comunicações estão nas mãos dos capitalistas, em grupos econõmicos-financeiros cada vez mais concentrados pelo poder material associativista. Há única alternativa que eu vejo está na organização para a revolução, e isto não se fará com diálogos, mas com ações cada vez mais pontuais em termos de enfrentamento físico-material; mas mesmo para a utilização da força é preciso o devido preparo,  que o grau de atomização e pasteurização da sociedade não se permitirá avançar nesses termos, porque estará cada vez mais arriscado fazê-lo. Deixarei vocês com as minhas inquietações e contradições abertas a um próximo diálogo impertinente.

Marcelo Gonçalves Marcelino

Um comentário:

  1. Utilização da força e organização para a revolução? Caro prof. Marcelo, este seu bolchevismo tardio não condiz com a atual correlação de forças em nossa sociedade. Podemos até discordar do governo Lula e da nossa estreita democracia burguesa, mas, realmente, tenho sérias dúvidas que algo muito melhor esteja visível no nosso horizonte político. Tamanha é a nossa indegência moral e intelectual que o PT surgiu das entranhas da Igreja e o MST campônio pensa que nos estamos em 1963.
    Ou seja, na atual correlação de forças, o resultado melhor possível é Lula-Dilma, o resto é ficar divagando sobre utopias e sonhos, pois um projeto alternativo, se não carece de uma vanguarda disposta, carece de uma verdadeira classe trabalhadora no sentido verdadeiro do termo, algo muito diverso dos lumpens-bolsa família que apoiam o Lula.
    Abraços!!

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